30 de set. de 2012

Breve ensaio sobre a relação entre a perluxidade quântica e a teoria das exposições transfinitas


Parte-se da premissa que:

A base do racionalismo analítico é construída a partir de um empirismo cimentado na hermenêutica transformativa de elações insofismáveis a cerca de supostos ilogismos e princípios fusionais, onde a lógica mítica afasta o véu da incongruência dos conjuntos enumeráveis que é permeada de números transfinitos. Ora, dentro de uma ótica axiomática, os teoremas abstratos confundem-se propositadamente com os paradoxos dogmáticos, como sempre intentaram os cânones do pós-estruturalismo científico.

Então, lança-se a suspeita se realmente:
  • Existe direta e cognitiva relação entre a topologia sólida e a psicanálise de Lacan?
  • Existe direta e cognitiva relação entre a teoria da relatividade e a sociologia de Deleuze?
  • Existe direta e cognitiva relação entre as pressuposições da semiótica e a sociologia de Latour?

Dirimidas essas questões, investiga-se se a rigor:
  • Existe alguma razão específica para o uso & abuso da profusão verborrágica e ostentação da erudição superficial nas manifestações literárias de alguns escritores?

E tudo me leva a crer que:
  • Estes ou aqueles que, ao empregarem terminologias pseudocientíficas, alheios ao real significados das palavras e sem justificativas conceituais ou fundamentadas, na verdade estão querendo transferir ao leitor a imagem de que são indivíduos dotados de vasta cultura, eminências do conhecimento, do saber e conhecer, capazes de impressionar pela intimidação e postura insuspeita.

Pois, in Dictus:
  • Fala demais por não ter nada a dizer : porque falar não é necessariamente dizer;
  • Se muitas vezes os textos parecem incompreensíveis, deve-se à inescrutável razão que não querem mesmo dizer absolutamente nada : porque se pode ofuscar a visão do leigo com o espetáculo da forma, dificultando-lhe a percepção da essência;

  • A arte vazia faz-se de usar duas palavras onde uma bastaria : porque um conjunto de palavras desconexas encerra o mesmo sentido de nenhuma.

À luz do exposto, concluo que:

Eu que, mesmo que não tenha nada a dizer, sinto-me plenamente apto a expor diversas teorias a respeito do Nada.

24 de set. de 2012

Campo avesso


- confissão

Onde o campo trespassa-me em espírito,
sonho agudo à margem do assomo,
que é um rio turvo e silêncio.
Calado eu fico e observo-te,
assim como a fome deseja o fruto.

As nuvens sabem-se prisioneiras do vento
e nada desejam além da mansidão.
Também sei-me um ente acorrentado,
tua carne abraça toda vontade.

Campo avesso - não sabes, nada percebe.
É que teu cheiro, em dom de alquimia,
denuncia: o delito é perto!

Abrupto o ataque, destruo o silêncio,
a inocência e a carne. Instinto é veneno.

Onde desejo, meu campo é voraz.



Um filho brota


Eis que os filhos são herança do Senhor. 
Salmo 127:3 

: um filho brota no chão de entranhas
germina eclode na terra mulher
um filho brota é fruto semente
germina geme urros de frio e suor
: ventre entranhas estranhos sorrisos
lágrimas riso e um começo de aurora
o pranto o parto o filho parido
cabeça cabelos o jorro que atora
: pescoço tronco ramos e membros
azeite de sangue o fruto coberto
êxtase um grito alívio sorriso
o sonho desejo e o real tão perto
: na véspera vontade concebido na mente
da paz euforia espanto e momento
unem-se mãos em prece pedido:
- Senhor, por favor, protegei meu rebento!


21 de set. de 2012

Morrer não e partir


Morrer não é partir,
é desistir, 

deixar-se levar.

O poeta viu um haicai
onde sabe 

que não existe um,

tal como o homem que deixou-se levar
para um longe, onde a morte não existe.


A morte é um poema de despedida
e a vida, um haicai de Deus.

Os dois cegos

 O cego mirou as constelações
e sorriu - as Três Marias
vibraram a lira de seus ouvidos.

Cães treinados - os ouvidos
farejam sopros de luz
nos cânticos anoitecidos.

O cego absorve a aura da poesia
pela pele, pelas narinas e ouvidos,

mas é cego aquele que enxerga
e nada vê e nada percebe.


20 de set. de 2012

O eleito


O Demônio não soube o que fez quando criou o homem político; enganou-se, por isso, a si próprio.
William Shakespearerich

Sim, você me conhece.

Pratico furtos
simples e qualificados,
extorções, contrabandos e chantagens,
tráficos e falcatruas.

Desvio verbas públicas.
Intimido, persigo,
ofereço e recebo suborno.

Organizo cartéis,
marco e dou as cartas.

Prevarico, negligencio,
obtenho vantagens
e informações privilegiadas.

Negocio coisas e gente,
vendo corpos.
Prostituo, sodomizo, sevicio,
assedio, abuso,
manipulo e chantagio.

Aniquilo almas,
dilacero sonhos
e destruo vidas.

Sim, sou demônio!
Você me escolheu,
Você me elegeu.

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O eleito de {no poem} é licenciado sob uma Licença Creative Commons Atribuição-SemDerivados 3.0 Não Adaptada.

Guerrilha burlesca

É muito triste perceber que vocês tornaram-se eles.

A guerrilha camuflou-se
com aspectos de paisagem
e conhece os atalhos da rota.
Mas, hoje em dia,
ela espalha-se pelos palácios.

A guerrilha organizou-se,
conspirou a revolta
e conhece as faces da miséria.
Mas, hoje em dia,
ela oferta pão e circo.

A guerrilha mutilou-se,
preparou-se para a tortura
e conhece o valor do silêncio.
Mas, hoje em dia,
ela brada discursos vazios.


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Guerrilha Burlesca de {no poem} é licenciado sob uma Licença Creative Commons Atribuição-SemDerivados 3.0 Não Adaptada.

19 de set. de 2012

Amaro repasto


Saboreio
farta amarga refeição.

Antepasto de ruibarbo,
panquecas de genciana,
souflê de cardo santo,
moqueca de centáurea,
pastelão de raiz de angélica,
calzone de hortelã,
empada de goma de mirra,
salada de cebola, rúcula & almeirão,
sorvete de chicória,
pudim de escarola,
chá de boldo, losna & manjerona.

Pois, de doce
já basta a vida.

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Amaro Repasto de {no poem} é licenciado sob uma Licença Creative Commons Atribuição-SemDerivados 3.0 Não Adaptada.

É preciso saber o mar



- merguhar no rebatismo
Contemplo o voo
que vem de dentro das gaivotas

e é doce contemplar o mar
o gosto da brisa flutua,
entorpece, embriaga,
reestabelece a sobriedade.

Raso, arrisco um mergulho:

- é preciso lavar o corpo por dentro;
- é preciso renovar o batismo;
- é preciso saber o mar,
por dentro e para fora dos sentidos.

Descartes, o pensamento & a pedra de existir

Penso, logo existo.
René Descartes


1.
Penso:
- sou pedra,
logo,
- triste e demente,
existo.

2.
Vejo a pedra,
oca de abstrações,
ela não pensa,
mas eu sei que ela existe.

3.
Quem pensa que é pedra,
existe,
e pedra, que não pensa,
também.

Ofício de pescar & oração de boa ventura


Oração de benção, 
prece de boa ventura,
a benção veio...
Houve júbilo no meio da pescaria.

Mais claro que o sol - o sol,
claro, mais claro que outros dias,
claro tão claro 
quanto o claro olho do peixe.

Dia claro 
nas águas claras,
o brilho do anzol
refletiu na íris do peixe.

Assustado, o peixe fugiu.
Alvoroço, o cardume
em confusa dispersão,
como flechas sem direção.

A benção veio, 
mas a boa ventura,
ao menos dessa vez,
veio apenas para os peixes.

Canto de amor, quase desespero



Sua juventude é ruidosa, ela não ouve.
{À maneira de Mme. de Sévigné}


Eu tratarei de tua sede
com o vigor de uma torrente,
e cuidarei de tua fome
com a fúria de uma avalalanche.

E plenos serão teus dias
e fartas as respostas aos teus desejos
que, se eu não conseguir satisfazê-la,
então não é amor o que te sacia.

Desenhos de um mar inventado


Desenhos de um mar inventado,
são náufragos, esboços que flutuam
ora rasuras, então são marinheiros reflexivos
e um vazio com gosto de maresia:
- a sede de minha mão são palavras de papel.

Enauseado, abstraio rotas imprecisas,
cantam sereias, iludo-me por que quero
e um farol, resplandece-me um lume opaco,
sei onde aporto, o revés de um canto solitário:
- melancolia é um cais de indiferença.

18 de set. de 2012

O dom de rejeitar o bom da vida


Refugou a carne da fruta
e cuspiu com desprezo o mel, 
que era o sumo.

Então comeu as cascas,
também o bagaço, fibras
e a medula das sementes.

Teve o melhor nas mãos,
mas praguejou
contra o amargo que escolheu.

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Do espelho, os cacos


(para a fantasia de Raquel)

Sólida figura, um mosaico real abstrato,
onde palavras engendravam sentimentos,
destilando amargo com dom de mel:
- Na fantasia, sorrisos que eram risos.

Sei teus ardis, uma princesa louca,
enquanto eu, tolo brinquedo de colecionar,
inda lembro de um verso, ode reverso:
- Quero-te e me quero em ti.

Somem os reflexos,
comprimo apenas os cacos
e, com cara de espanto e decepção,
como quem identifica o fogo amigo, expludo:
- Às vezes a felicidade é apenas uma ilusão dos medíocres.



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Versos Rasos




 Eu achava que tamanho tinha a ver com poesia, eu não sei.
  {Oswaldo MONTENEGRO, in Drops de Hortelã}

Arraso meu verso baixo,
pois é tão rasa, a sua profundidade.

Ralo meu texto curto,
pois é tão rala, a sua altura.

Abrevio minha palavra estanque,
pois é tão breve, o seu alcance.

Intimido minha voz opaca,
pois tão tímida, a sua magnitude.

Mas ainda curto meus versos curtos,
e mais, sei, eu não consigo,
e por isto mesmo é tão pouco,
aquilo que pouco digo.

{Para Jairo Batista, 
que acha que meus versos são curtos demais}

Breve Noção de Tudo

DEUS


{Assim mesmo:
- sem travessão,
- sem aspas,
- sem minúsculas,
- sem grifo,
- sem sublinhado,
- sem itálico,
- sem ponto final,
vírgula,
asterisco
ou reticências.}

Provérbios


PRESUMI o engano de amanhã, é o que tenho de certo hoje.

E vi louvarem a boca e os lábios do estranho, mas estrangeira, minha língua, esteve muda.

E arremessei a pedra na cabeça do insensato e soterrei sua ira com o peso da areia.

Mas meu amor aberto encobre toda repreensão.

E meu beijo de amor fiel é um engano e abre feridas de aborrecimento.

Minha alma faminta acha o mel amargo, já à farta até o favo é um doce.

Sou ave que vagueia longe, pois já não sei o meu lugar.

Trouxe óleo e perfume para meu amigo doente, pois meu coração cordial não conhece conselhos.

Abandonei meu pai e meu irmão e, amigavelmente, entrei na casa de meu adversário, pois ele está sempre mais perto que meu irmão.

Pai, perdoe-me a falta de sabedoria e alegre teu coração com o silêncio ante o desprezo.

Sussurrei calúnias ao meu amigo, mas o maldito dormia no frescor da tarde.

Banhei-me na ladainha da mulher rixosa tal como se me afogasse no dilúvio

Contive o óleo, enquanto o vento acometia minha destra.

Agucei o rosto de meu inimigo com o ferro afiado.

Comi o fruto da figueira, enquanto o guarda velava a honra de seu senhor.

Deitei minha sombra na secura da areia, pois meu coração é tão tosco quanto eu mesmo sou.

Meus olhos não se satisfazem com a perdição, da qual no inferno há fartura.

Fui provado no crisol e no forno e dei prata e ouro em louvores.

Pisei a mão do tolo como a um gral de grãos de cevada pilados e tomei para mim a sua estultícia.

Saciei a fome de minhas ovelhas com o fruto de meu coração.

Nunca tive riqueza por saber que minha coroa é de outra geração.

Ajuntei as ervas dos montes, mas perdi os renovos pelo caminho. 





O monótono poema da espera


{Se o poema é campo de espera, é em mim que plantas teus versos.}

Enquanto resplandecia um opaco sol de arremedo, era parida à exaustão uma melancólica manhã de outono, sem ânimo, vontade ou expectativa.

Também trazia, em seu cordão umbilical, uma réstia de luz, mais fria que as sombras. Seu corte fez-se com os dentes, que também eram frios.

Faminta, era dada a alimentar-se do sumo das heras e do limo das encostas. Ruminava pedras, folhas mortas e o pó dos caminhos abandonados e esquecidos.

Quase em desespero, abraçou o meu peito, um manto árido com cicatrizes de arado, e salpicou-lhe um copioso substrato de restos de amargura e sorrisos em estado de decomposição.

Chegada a estação das chuvas e dos prantos sufocados, germinou a tímida árvore do silêncio, com tronco de esqueleto frágil e braços sem vida, de onde pendiam frutos de um verde vazio e distante, com gosto de nada.
{Se o poema foi um campo de espera, foi em tua sombra que sepultei ilusões.}


Voz en el desierto

{lobos lamiendo la indiferencia}
Ya no estaba seguro
Después de todo ¿para quién escribir versos?
Ah, mis versos, estos lobos hambrientos
Siempre un lamer de indiferencia

Un libro que desempeña en una esquina
Un pensamiento oculto entre los objetos
En una palabra u otra
En medio a una multitud de silencio

Los poemas no son revolución
No transforman, ni cambian nada
sólo se atreven a navegar
Distraídos por lapsos del tiempo

La exactitud siquiera saben
Si me vienen a decir algo sobre yo
Y, como una voz que clama en el desierto
Que estoy recibiendo más sordos a lo que me grito.

 

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