8 de mar. de 2011

Carnaval, a festa colossal

Ilustração de Atlan Coelho, para o livro Testemunha Ocular

Não sou Luiz Melodia, mas também fico triste quando chega o Carnaval. (¹)

De uma forma simplista {e até simplória}, digo que o Carnaval é uma festinha imbecil e sem nenhuma originalidade. Todo ano é um pot-pourri * de “Alá-lá-ô”, coma alcoólica e estatísticas de mortes nas estradas. (²)

Mas, enfim, era segunda-feira de Carnaval, liguei a televisão à noite e estava sendo transmitido o desfile das Escolas de Samba do Rio de Janeiro.

No momento em que liguei o aparelho, desfilava a União da Ilha e o tema de enredo da Escola era Charles Darwin. Bem, o enredo não era exatamente sobre Charles Darwin e sim, sobre sua passagem pelo Brasil, lá pelos idos de 1832.

Conta a lenda que o brilhante naturalista britânico ficou encantado com as belezas naturais – quase uma redundância - que encontrou por aqui e, em especial, com a variedade de insetos que os solícitos brasileiros da época deveriam levar-lhe em pencas:
- Olha aqui, Seu Darvin, esse besouro! E essa joaninha, olhe esse coleóptero, veja essas aranhas coloridas e esse rola bosta desajeitado...

Imagino que Sir Darwin, já de bag cheio, mas, por ser uma pessoa educada, fingia encantar-se com toda aquela ciranda de espécies.
- Good, good! Very good! Beautiful! Wonderful! Formidable, this nature is a true spectacle!

Seria algo mais ou menos semelhante como quando vamos visitar alguém na roça e o sujeito, meio querendo agradar, meio querendo impressionar, começa a trazer um monte de espécies inusitadas. Ele sabe que, por vivermos em meios urbanos, não entendemos lhufas de alhos e nem de bugalhos silvestres e então, ele começa a nos mostrar uma grande variedade de hortaliças, leguminosos, tubérculos e outros seres estranhos:

- Acho que você nunca viu uma taioba igual a essa! E esse alho-poró? Veja essa bertalha! Já viu um azevem assim? O que acha desse triticale?

Para também sermos educados, ao secular estilo britânico, fingimos interesse, elogiamos, fazemos perguntas, demonstramos curiosidade e satisfação. E, se o exibicionista não for muito esperto, também poderá acreditar que nós ficamos encantados com tudo aquilo.
Pois bem, acontece que Sir Charles Darwin jamais poderia imaginar que {nem que fosse um ser iluminado e um visionário}, quase cento e oitenta anos depois que ele tivesse passado pelo Brasil, cerca de umas quatro mil pessoas sairiam desfilando por uma avenida iluminada, fantasiadas de besouros, aranhas, formigas, grilos, louva-a-deus e cobras, em uma irracional tentativa de homenagear seu remoto “deslumbramento”, diante de tão exótica beleza de espécies tupiniquins.

E é por isso que, para mim, o Carnaval é, e sempre
será, uma festa muito estranha.

Outro dia, passou no Fantástico {que ficou ainda menos “fantástico”, com a saída da Poeta), a odisseia de um carnavalesco ao reconstruir em um mês, todo trabalho de um ano inteiro, que havia sido consumido pelas chamas de um enorme incêndio.

O sujeito saiu movendo o mundo, mobilizando pessoas, levantando grana, pechinchando, comprando toneladas de materiais, conseguindo emprestado com outras escolas de samba solidárias, sucatas e chassis de velhos carros alegóricos, estabelecendo turnos ininterruptos de trabalho... Uma verdadeira missão pós-guerra e, pasmem: - Ele conseguiu!

Nosso herói (como diria Bial) venceu o tempo e o improvável e colocou sua Escola de Samba na Avenida.

Puxa, fiquei pensando, se uma pessoa dessas tivesse tanta energia e disposição, foco e determinação para construir coisas realmente úteis, tais como creches, escolas, centros de convivência de idosos, espaços para ensinar ofícios às pessoas carentes, artes às crianças, laboratórios, oficinas, áreas de lazer, bibliotecas, postos de saúde... Que belo exemplo nós teríamos aí!

Mas, não! Tanta energia e trabalho canalizados para atingir o objetivo que era o de uma Escola de Samba percorrer setecentos metros em menos de duas horas e... Acabou!

É tudo muito efêmero e, para mim, totalmente sem sentido.

Ah, agora só falta mesmo eu escrever uma teoria revolucionária sobre a vida no campo, para que, daqui há uns duzentos anos, cerca de três mil agricultores saiam pelas estradas vicinais, fantasiados de alcachofra, berinjela, jiló e inhame, em homenagem a minha visita à bucólica Colônia Witmarsum.(³)

É mesmo o caput!

_________
(1) Alusão à letra da música Quando o Carnaval chegou.
* A expressão pout-pourri é comumente usada de forma errônea.
(2) Citação do livro Denúncia Vadia {Avatar Publish, 2002}, do Autor.
(3) Distrito fundado por imigrantes alemães menonitas, pertencente ao Município de Palmeira, no Estado do Paraná, localizado na Região dos Campos Gerais.
 

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